Numa destas grandes conversas frutíferas que temos com amigos pelos bares da cidade uma pérola é lançada por um deles: “as mulheres só são felizes quando ouvem mentiras, é natural da mulher!”.

Qualquer mulher teria um ataque de pelancas ao escutar isso e para quem me conhece deve ter imaginado que usei todos os argumentos possíveis e imagináveis para defender as mulheres, soltei mais algumas pérolas no calor da discussão e depois brindamos por não termos chegado a lugar algum…Que nada, fiquei calada, paralisada! Silêncio geral todos olhando para a única mulher na mesa, eu, e eis que surge “um brinde ao silêncio da confirmação”!

Foi então que me pronunciei: “Não queremos ouvir mentiras, não somos felizes quando ouvimos mentiras, nós, assim como os homens, apenas nos iludimos com aquilo que nos convém, se quisermos ouvir uma coisa e ela for dita, não será contestada… somos acima de tudo românticas!”.

Houve um “frisson” generalizado… O tema rendeu mais duas horas que seguiram com direito a diversas piadas machistas, pirrachinha e cargas d´água de todos os níveis. A homarada se esbaldou às custas da minha apatia incomum!

Fiquei consternada diante de tal crença. Quanto vazia ela é e o quanto tantas pessoas se baseiam em nada, ou em enredos ocos, para avalizar suas atitudes questionáveis. Quantas vezes fechamos os olhos para o que não queremos ver. Não somos nós mulheres que somos românticas como respondi no ápice da minha paralisia, o ser humano é repleto de desejos e pensamentos simples recheados de esperanças de que as pessoas sejam e ajam como projeta seu mundo ideal.

Quantas vezes nos deparamos sentindo raiva de nós mesmos por não termos visto o que estava claro como as luzes de neon. Seria uma fuga da realidade o ser humano acreditar no que é dito ou na imagem mental que fazemos para não encarar os fatos e não sofrermos com ele?

O mundo em todas as áreas assusta, a realidade da vida muitas vezes dura magoa e cria feridas enormes na alma. Mudamos o comportamento automaticamente após decepções. Depois de cada uma delas, é quase impossível alguém continuar exatamente como antes. Cria uma postura reativa com algumas ações incoerentes ou no mínimo fica alerta sobre qualquer situação que possa levar ao mesmo caminho doloroso, e ao menor sinal de similaridade tem alguma atitude inesperada.

Além desta perspectiva ainda existem outras, que nos questionamos constantemente. Como uma pessoa é a última a ficar sabendo de algo ruim sobre seu filho, marido, esposa e/ou amigo. O último a saber, é sempre o ingênuo, o que acredita nas pessoas e/ou em alguma pessoa em específico. É aquele que tem um sentimento forte ou um medo tão grande que prefere não reparar nos sinais para não correr riscos de descobrir algo que o faça sofrer.

Coloca uma venda nos olhos por medo de que a luz o faça perder a visão e ficar desnorteado.

Será que preferimos mesmo ouvir mentiras pelas mentiras ou acreditamos nelas por medo doque seria a verdade? Será que preferimos internalizar que acreditamos em algo por ter ciência de que não conseguiria resolver dentro de si as consequências da verdade?

O que tenho certeza é que ninguém quer ser enganado, seja homem ou mulher. E mais certeza tenho é que as pessoas que tem o comportamento mentiroso, àquelas que mentem para seus parceiros e família, achando que são eles felizes com o mundo de Alice que criam nas suas falas, são exatamente as pessoas que não segurariam o tranco ao saber que foram enganados uma única vez sequer, e esses sim, ao meu ver, é que gostam de ouvir mentiras e acreditam nelas.

É confortável achar que é o mestre dos enredos mirabolantes e o astuto mor, aquele que descobre uma mentira de longe. Só que não! Eles são os mais enganados, primeiro por eles mesmos e segundo por aqueles os quais asseguram que nunca o fariam por tê-los nas mãos enredados com tanta maestria em suas teias inverídicas!

Enfim, as coisas da vida são assim: quanto mais segurança em algo você tem, mais riscos você corre!

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